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O contador de histórias


Eu não estava nem um pouco enganada. Acho que ando lendo as críticas certas, porque o filme é tudo o que eu esperava. “O contador de histórias” é emotivo, bem desenhado – apesar de fragmentado nas mãos de quatro roteiristas: Mauricio Arruda, José Roberto Torero, Mariana Veríssimo e Luiz Villaça, engraçado e de forte cunho social. Por esta última característica, o ótimo filme brasileiro recebeu um selo da Unesco. E, na minha modesta opinião, merece ganhar mais e mais prêmios. Até agora, “O contador de histórias” recebeu o prêmio de Melhor Filme no Festival de Paulínia e os três atores que interpretam o protagonista dividiram o prêmio de Melhor Ator, no mesmo Festival. Além do prêmio de Melhor Filme de Ficção, através de votação popular em Paulínia.


A narrativa se passa em Belo Horizonte, no final da década de 70, e conta a história de Roberto Carlos Ramos. No entanto, não se engane. Trata-se de um espetacular cinema de ficção. A licença poética é o grande mérito de diretor Luiz Villaça, ele consegue ser fiel aos fatos, sem abandonar a poesia e a sensibilidade do cinema, da obra de arte. Vamos à sinopse oficial: O filme mostra a vida de Roberto Carlos Ramos, hoje pedagogo mineiro e um dos melhores contadores de história. Criado na Febem desde os seis anos de idade, aos 13 anos ele conhece a pedagoga francesa Margherit Duvas, que mudou sua vida radicalmente.


Como todos sabemos, é difícil confiar em sinopses. Ou melhor, é quase impossível extrair alguma opinião de uma sinopse. Mas até que essa deu para o gasto. Só que o filme vai além do “baseado em fatos reais”. A maneira como o diretor utiliza os recursos cinematográficos para valorizar a imaginação de Roberto é muito interessante; é notável a forma como são empregados os closes, eles tornam a crueza das difíceis e dolorosas situações reais mais sutis; a atriz portuguesa Maria de Medeiros (que foi a namorada frágil e doce de Bruce Willis, em “Pulp fiction”) encarna um sotaque francês quase perfeito – algumas palavras ganham uma entonação bem engraçada – para interpretar uma pedagoga que tinha a ingenuidade e a bondade de que o mundo precisa cada vez mais e o menino que encarna o protagonista aos 13 anos (Paulinho Mendes) é muito talentoso.


A história da vida de Roberto Carlos Ramos é apaixonante, mas constitui uma exceção ao absurdo que vivemos com o abandono de crianças pelas ruas desse país. O fracasso de todos os órgãos públicos destinados a cumprir os direitos humanos no Brasil é mais do que óbvio. A cena em que essa ideia é trabalhada é brilhante, por sinal. Com a colaboração de Malu Galli, que personifica a figura das várias educadoras que passaram pela vida do mineiro com a inevitável dor do fracasso estampada nos seus olhos. "O contador de histórias" incorpora também um elemento documental ao inserir a narração em off do próprio protagonista e em sua aparição, na sequência final. Não é uma produção irretocável, talvez seu final deixe um pouco a desejar. Principalmente com relação ao rapaz que interpreta Roberto adulto (Cleiton Santos). As poucas cenas em que ele aparece destoam do restante do filme. No entanto, essa pequena queda no ritmo não tira os méritos da película. Reflexão e sorrisos não vão faltar.


Bisous à tout le monde...

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A função do cinema

Essa é uma discussão histórica e sem fim. Qual seria, afinal, a função do cinema. O puro entretenimento “despretensioso”? A educação de seu público? Estaria a serviço de ideologias embutidas? Ou seria a arte pela arte? Todo esse questionamento não se restringe ao cinema, passa pela arte como um todo, como sabemos. A minha opinião é simples e passa longe de palavrórios teórico-político-social-científico. Esse imbróglio envolve os conceitos realidade e ficção, acrescidos de outros rótulos como: comédia, aventura, romance, drama, ... Acredito que o importante seja tocar o espectador. Fazer com que a obra que se reproduz com a ajuda de aparatos e habilidades técnicas se solte da tela do cinema (ou da televisão) e alcance a emoção daquele que está assistindo.

O maior mérito de qualquer arte é movimentar as emoções. Meu diagnóstico para um bom filme é de acordo com as sensações que ele me provoca (ou não). É inerente ao cinema ser sensacional! Se for para dar uma chacoalhada na nossa visão social, que seja. Ou para fazer-nos rir dos problemas, e abstrair toda nossa tensão diária. Ou mesmo para nos fazer chorar de emoção com uma história que não é a nossa, mas poderia ser. E por aí vai. Muitos vivem intensamente seus dilemas pessoais, mas esquecem até mesmo de se emocionar com eles. A coisa piora quando se trata de outra pessoa. A obra cinematográfica, quando olhada com atenção pode sensibilizar, ensinar, encantar, chocar,...

É importante fugir de patrulhas de todo o tipo, sejam ideológicas (termo criado por Cacá Diegues), ou sejam estéticas. Estamos falando de obras de arte e para arte não pode haver amarras. Minha única ressalva é aos filmes que não envolvem o essencial de uma obra de arte: o genuíno sentimento.

Nota: O que motivou essa elucubração, além da minha própria reflexão sobre a questão, foi a publicidade criada em torno de “O contador de histórias”. Que parece (ainda não assisti, mas pretendo) ser daqueles bons filmes que conseguem unir importantes discussões sociais – como a inexistência de políticas publicas eficazes para menores abandonadas nos últimos anos – com um olhar arguto sobre a interioridade de uma criança. Essa é uma forte vertente do cinema brasileiro e isso não pode ser abandonado. A união de duas importantes funções torna nossos filmes “documentos da emoção”.

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